Família luta por mulher escravizada em casa de desembargador de Santa Catarina

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A família de Sônia Maria de Jesus luta no Judiciário para retirá-la da casa do desembargador Jorge Luiz de Borba e de sua esposa, Ana Cristina Gayotto de Borba.

Sônia é surda e foi liberta da residência do casal em Santa Catarina, em junho do ano passado, por fiscais do trabalho que a encontraram escravizada na casa dos Borba.

A mulher foi levada a um abrigo, no entanto, acabou retornando após o casal ir buscá-la. Na época do resgate, Borba chegou a emitir nota negando as acusações de que ela estava em situação análoga à escravidão e dizendo que faria o procedimento para reconhecimento de paternidade de Sônia, o que foi feito nos últimos meses. A avaliação das verbas trabalhistas não pagas à Sônia chega a quase R$ 5 milhões.

A família biológica de Sônia disputa com os Borba no Judiciário os cuidados junto a ela. A coluna conversou com Marcelo Silva de Jesus, irmão mais novo da mulher, que relatou o ingresso da família biológica como parte no processo que já havia sido apresentado pelo desembargador em busca da guarda. Segundo ele, as advogadas da família estão habilitadas, isto é, aptas para atuar oficialmente no processo, desde janeiro deste ano.

Uma audiência pública no senado tratará do caso no início de maio. Em 23 de outubro, o casal foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República pelo crime de manter a trabalhadora em regime análogo à escravidão.

Segundo uma reportagem do Intercept com o portal Catarinas, Sônia vivia com os Borba desde os nove anos. A mãe a entregou temporariamente à psicóloga Maria Leonor Gayotto, mãe de Ana Cristina, em 1982, devido a uma situação de violência doméstica. No entanto, a família passou, depois, anos procurando por Sônia.

Denúncia

Desde que foi resgatada da casa do desembargador — e meses depois levada de volta, com anuência do STF — Sônia se encontrou três vezes com sua família biológica, sempre em Florianópolis.

“Nós, como família da Sônia, estamos entrando nesse processo. Nossa posição é aprimorar nosso aprendizado em Libras para conseguir ter o máximo de qualificação possível para concorrer com eles [os patrões]”, afirmou Marcelo.

Inicialmente, os patrões pedem o reconhecimento de paternidade e, se não for concedida, requerem a curatela por entender que a trabalhadora não tem condições de responder por si mesma.

A família biológica tem defendido no processo a autonomia de Sônia e afirma que desde que ela começou a ser alfabetizada é possível notar uma evolução em seu desenvolvimento e socialização.

“Temos defendido bastante a autonomia, porque a permanência dela lá [na casa dos patrões] não é saudável. As melhores condições de vida que ela tem recebido hoje só passaram a acontecer depois que a Justiça determinou. Desde quando ela foi resgatada e começou a ter essa alfabetização pudemos ver uma evolução gritante. Ela tem se socializado, vem conseguindo aprender e se comunicar. A gente consegue sentir que ela tem essa capacidade de aprender. Temos pedido para fazerem mais avaliações com a Sonia. Entendemos que o cenário é diferente daquele de quando ela foi encontrada”, contou o irmão mais novo.

A última visita da família foi há um mês, no início de março:

“Nesse encontro foi mais gente, foi mais descontraído, nós saímos para comer e ficar com ela. Já estamos fazendo uma comunicação primária em Libras. Estamos numa fase de reconstrução, para os integrantes da família que já a conheciam, e de construção, para os que, como eu, não conheciam a Sonia ainda. Temos a expectativa de fazer mais encontros e agora vivemos um momento menos crítico, onde conseguimos fazer o agendamento desses encontros direto com os advogados da família Borba, sem precisar da Justiça intermediando”, declarou Marcelo.