Em gesto que revela a crescente tensão entre o Poder Executivo e o Legislativo fluminense, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados encaminhou, nesta quarta-feira (29), ao Paulo Gonet, Procurador-Geral da República, um pedido formal de prisão preventiva do governador do Estado do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). A iniciativa, assinada por parlamentares declaradamente alinhadas à esquerda, alega que o governo estadual está diretamente envolvido em uma “chacina continuada” no Complexo do Alemão, que teria resultado em pelo menos 119 mortes na operação policial denominada Operação Contenção.
As deputadas — entre elas Talíria Petrone (PSOL-RJ), Erika Kokay (PT-DF) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ) — somam-se ao presidente da comissão, Reimont (PT-RJ), no documento que exige não apenas a prisão, mas o imediato afastamento de Castro do cargo para evitar novas operações de letalidade elevada e para salvaguardar a integridade da investigação.
Acusações centrais e fundamentos do pedido
No ofício dirigido ao PGR, as parlamentares sustentam que existe “risco concreto à ordem pública e à investigação” caso o governador continue exercendo suas atribuições, uma vez que a execução das forças de segurança sob sua gestão estaria sendo utilizada como instrumento de repressão indiscriminada. Há ainda menção de falha no uso de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública pelo governo estadual, argumento que reforça a tese de omissão e irresponsabilidade administrativa.
Durante coletiva de imprensa, Reimont afirmou categoricamente: “É a maior chacina do Brasil, superando a do Carandiru”, fazendo referência à operação de 1992 no presídio paulista. A comissão anunciou que nesta quinta-feira visitará o Complexo do Alemão, onde pretende reunir-se com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro para coletar depoimentos e evidências direto do campo.
Defesa do governo estadual
Por sua parte, o governo do estado insiste que a operação foi justificada e necessária para combater o Comando Vermelho, organização criminosa com forte presença no Alemão e região, apontando que o estado não pode recuar diante da escalada da violência. O executivo estadual argumenta ainda que não há ilegalidade na atuação das forças de segurança, e que as mortes são consequência de enfrentamento legítimo — posicionamento que, sob a ótica das deputadas autoras do pedido, reforça a necessidade de uma apuração externa e imparcial.
Impactos políticos e repercussão
O pedido de prisão imediata de um governador em exercício é medida extrema e raramente vista na história recente da política brasileira. Para partidos de esquerda, trata-se de instrumento para responsabilização institucional por violações de direitos humanos; para a base política de Castro, porém, marca o início de uma ofensiva contra o Executivo estadual que poderá ter repercussões graves nas eleições de 2026.
Além disso, o uso da Comissão como palco para esta iniciativa reflete, segundo analistas, uma mudança de estratégia: em vez de disputar apenas via votos, as bancadas de esquerda passam a adotar instrumentos jurídicos e regimentais para fiscalizar e pressionar gestores adversários. Por outro lado, a iniciativa poderá ampliar o desgaste político do governo fluminense, mesmo que na prática o afastamento imediato ou a prisão preventiva sejam remotos — dadas as protegerções institucionais e os trâmites legais envolvendo governadores federais.
Conclusão
O anúncio de requisição de prisão de Cláudio Castro coloca injustamente o século XXI do combate ao crime nas comunidades sob o prisma de um cessar-fogo institucional entre Legislativo e Executivo — com a esquerda jurídica assumindo papel protagonista. O Brasil e o Rio de Janeiro observam agora não apenas o desfecho da operação, mas a resposta de um governo que se recusa a admitir fragilidades. A resistência de Castro ao rompimento do discurso oficial, baseada em “combate ao tráfico” e “ordem pública”, enfrenta agora a investida de parlamentares que acusam seu governo de chacina e negligência.
Neste contexto, será decisivo acompanhar os próximos dias: a visita ao Alemão, os depoimentos que surgirem e eventual decisão do PGR sobre o pedido. O marco — seja de responsabilização real ou de pressão simbólica — será registrado na história política fluminense.








