Quinto superintendente da PF (Polícia Federal) em Mato Grosso do Sul desde 2018, o delegado Carlos Henrique Cotta D’Ângelo é o primeiro a poder dizer que a nova delegacia de Ponta Porã está em fase de construção, reivindicação antiga em um território de fronteira cobiçado pelas facções criminosas. Mas os R$ 60 milhões em infraestrutura passa longe de ser o ápice de sua satisfação profissional: “Eu vim aqui para pegar o ladrão”.
Há 22 anos na Polícia Federal, D’Ângelo estreia no cargo de superintendente. Antes, já passou por todos os setores – áreas administrativas, policial, inteligência e corregedoria. Graduado em Direito e Administração Pública, o delegado comandou o setor de combate ao crime organizado e esteve à frente de operação contra corrupção em Mato Grosso, no ano de 2019. A última lotação foi no comando da delegacia de Juiz de Fora (Minas Gerais).
Bom de prosa e com disposição para passar o dia concedendo entrevistas à imprensa, o novo superintendente conta que quando aparecia na televisão tanto quanto o ator Reynaldo Gianechini chegou a levantar suspeita de que seria candidato. Mas, para ele, a vida de polícia e de político não se mistura.
“O pessoal achava que tinha pretensões políticas. Mas eu não misturo política com polícia. Polícia veio para prender político”, diz.
Sobre as diversas modalidades de ladrão, é justamente o de “colarinho branco” que mais exige recursos das investigações.
Segundo delegado, a corrupção está em todas as instâncias, mas só em algumas a polícia alcança. (Foto: Henrique Kawaminami)
“Sem dúvida nenhuma exige mais, até pela sofisticação dos crimes que eles praticam. São sempre mais complexos e que demandam uma estrutura investigativa com mais tempo. Além dos problemas característicos da engenharia desse tipo de crime, há barreiras legais. Por exemplo, a prerrogativa de foro. Onde para investigar determinadas pessoas você precisa de uma série de autorizações. Na medida, que você tem informações sobre juízes, políticos, promotores, você tem que pedir licença a um par deles para poder investigar. Coisa que você não tem para nenhum outro cidadão”.
Desta forma, apesar de a corrupção estar em todas as instâncias, só em algumas a polícia alcança. Outro exemplo foi o uso de algemas, que passou por revisão de regras quando os alvos eram pessoas mais influentes e poderosas.
“O casuísmo que é ruim. Porque só agora tem que ter cuidado com as algemas, com transporte no camburão. Não sou contra isso, mas tem que ser para todos. A própria reforma da lei acabou com a improbidade no Brasil. Agora a regra para massa carcerária de sempre, pobres e pardos, continua no mesmo batidão”.
Obras de R$ 60 milhões – Após muitos anos no campo das promessas, a nova delegacia de Ponta Porã, que faz fronteira com Pedro Juan Caballero (Paraguai), começou a ser construída. O custo é de R$ 25 milhões, com previsão de término em dois anos.
Atualmente, a delegacia tem porte acanhado e há pelos há uma década sofre críticas pela falta de estrutura. Ponta Porã é endereço de exército de “soldados” da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), além de ser corredor para o tráfico de drogas e armas.
Já na fronteira com a Bolívia, uma nova delegacia será construída em Corumbá. A obra deve começar em até três meses. Outros R$ 20 milhões vão para a reforma e ampliação da superintendência da PF em Campo Grande. O local também terá mais dispositivos de segurança, com instalação de tecnologia com reconhecimento facial.
Sobre as finanças, o novo chefe da PF não abre os números do orçamento, mas diz que não deve faltar dinheiro para custear combustível, viaturas, energia, diárias.
“O que a gente pode dizer é que os valores sempre vão carrear na linha do ‘são sempre inferiores’ à necessidade’ Mas tiveram um suplemento com relação a 2023. Então, para se manter o que se fez no ano passado, os recursos estão garantidos, estão tranquilos. E temos recursos para reformas prediais, estamos falando de R$ 60 milhões para essa parte estrutural”, afirma D’Ângelo.
Efetivo, tecnologia e parcerias – O combate às organizações criminosas na fronteira vai reunir as vertentes de efetivo, tecnologia e integração entre as forças policiais.
“Você não substitui o ser humano 100% com a tecnologia. E não adianta colocar uma quantidade em massa sem tecnologia. O caminho vai ter que se esse. Para além disso, a gente tem muita expectativa com a palavrinha da moda, que muito se fala, mas pouco se aplica, que é integração entre as forças. Daí a razão desse projeto Ficco. Participei da criação dele há 12 anos em Minas Gerais. É muito difícil porque o Brasil não tem essa cultura de integração entre as forças”, afirma o delegado.
Em dezembro de 2023, uma sala de controle foi montada dentro da Superintendência da Polícia Federal, em Campo Grande, para receber o Ficco (Força Integrada de Combate ao Crime Organizado). O grupo é formado por policiais federais, rodoviários federais, civis, militares, agentes de presídios de Mato Grosso do Sul e da União.
“Imagina, são cinco, seis forças distintas, cada uma com seu orçamento, sua previsão legal. Mas dá certo. É preciso ter muito boa vontade e muito jogo de cintura. E como ali [fronteira] é um problema que aflige todas as forças, vamos juntar todo mundo e fazer esse trabalho. Vigilância por drone, vigilância aérea, muita informática, muito cruzamento de dados para facilitar o trabalho humano”.
Além da superintendência, a PF mantém estrutura no Shopping Campo Grande com oferta dos serviços de emissão de passaporte, controle de segurança privada e controle de armas e produtos químicos.